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Foto do escritorCentro Ásia

Conectando Gerações: A Jornada de um par de Kokeshi e a Imigração Japonesa



*Por Lina Saheki




Este casal de kokeshi conta uma história especial que nos conecta diretamente com o dia de hoje, 18 de junho - Dia da Imigração Japonesa. Conto a história desde o início:


Quatro meses atrás, arrumando as coisas da minha recém-falecida mãe, Kiyoko Saheki, descobri que ela tinha em casa algumas malas antigas fechadas, com pertences dos seus avós (que a criaram). Malas com fotos e objetos. Dentre eles, um par de bonecos kokeshi.


E isso me chamou a atenção porque, além de professora de japonês, tenho uma pequena coleção de bonecos e artesanato japonês. A princípio, esse par era muito parecido com outros que temos na coleção, exceto por um detalhe: a inscrição em carimbo "OSK LINE". Para todos os efeitos, um mistério. Assim, fui pesquisar.





OSK Line – Em 1884 foi fundada a Osaka Shosen Kaisha (OSK), empresa de transporte marítimo sediada em Osaka. A esse respeito, o site da empresa MITSUI OSK LINE (MOL), que incorporou a OSK LINE, traz as seguintes informações:


“As relações do Brasil com a Mitsui O.S.K. Lines começaram com o navio Kasato Maru, o navio da esperança. Foi ele que trouxe a primeira leva de imigrantes japoneses ao Brasil. [...] Mais de 180 mil imigrantes japoneses fizeram a maior travessia de suas vidas a bordo de algum navio da MOL. A primeira, muito lembrada, levou 52 dias. A chegada do Kasato Maru, em Santos, no dia 18 de junho de 1908, é o marco inicial de uma jornada e de um laço de fraternidade. Foi quando os 781 corajosos navegantes que, quase dois meses atrás, haviam deixado Kobe, chegaram ao Brasil para trabalhar na agricultura.”


Ou seja, a OSK LINE foi a responsável - apenas e tão somente! - pelo transporte marítimo da primeira onda de imigração japonesa ao Brasil. O próprio Kasato Maru, navio que inaugurou a imigração japonesa ao Brasil e que deu origem ao Dia da Imigração Japonesa, era de sua frota.


Pronto! Já sabia o que significava aquela inscrição até então misteriosa. Então, essas kokeshi eram de um navio da OSK LINE que fez a travessia Japão-Brasil.


Procurei, então, por objetos com a marcação OSK LINE na internet, mas só encontrei, no Google, com a marcação MITSUI OSK LINES ou MOL (ou seja, pós-1964, data da incorporação da empresa e da mudança de nome).



Apesar disso, tinha em minhas mãos a prova material de que essa prática existia mesmo quando a empresa era a OSK LINE. E de QUANDO seriam essas bonecas? Era a nova pergunta...


Algumas horas de pesquisa depois, descobri que a prática de distribuir bonecos kokeshi como souvenirs era relativamente comum nas décadas de 1950/60 entre as companhias aéreas japonesas ou entre as empresas internacionais que voavam para o Japão.




A Northwest Orient Airlines, por exemplo, distribuía vários tipos de kokeshi para seus passageiros, exatamente nesse estilo, e a PAN AM também fazia uso da prática, assim como a Japan Airlines (JAL). Uma prática que provavelmente passou a ser adotada também por outras companhias, não só aéreas, mas também no transporte marítimo de passageiros.


Além disso, esse estilo de kokeshi, chamado “donko kokeshi”, foi uma inovação do pós-guerra ou mesmo de um pouco antes da própria guerra, segundo alguns autores de livros sobre o tema. Elas foram bastante populares entre as décadas de 1950 e 1970, em especial nos anos 1960.


A datação das nossas peças ficaria, então, entre 1945 e 1964 - do pós-guerra à incorporação da OSK LINE. Pronto, agora sabia o período aproximado e de onde vieram essas kokeshi.


Agora restava a última e derradeira pergunta. QUEM fez essa travessia? A quem pertenceu esses bonecos?

Olhando para a imigração do lado da minha mãe, as datas não batem. A imigração deles é mais antiga, de 1933. A única data que bate é se eu olhar para o lado paterno. O meu pai fez a travessia em um dos últimos barcos da Imigração, em 1960, no AFURIKA MARU. Teria sido dele esse par de kokeshi? Faria sentido pela data e pela afeição dele ao artesanato japonês. E porque estava na mala com os pertences dos meus bisavós? Será que papai deu para eles em algum momento? Não tenho como saber. Hoje, a memória do pai já não alcança tão longe. Olho para o par de kokeshi e me pergunto: "ahhh... se elas pudessem falar..." e sorrio, ao me dar conta de que, na verdade, elas podem.


Por causa delas, passei longas horas pesquisando e imaginando os navios de imigração, os souvenirs desses meios de transporte, estudando os estilos de kokeshi por épocas e, por fim, relembrando as datas das imigrações dos meus pais.


Esse par de kokeshi é a ligação material à toda uma miríade imaterial de histórias e memórias- esquecidas e relembradas. Afinal, como um par de bonecos de madeira pode me conectar à história da imigração japonesa no Brasil? E, por isso mesmo, à história da minha própria família?


Quem sabe quais são as histórias que nossos antepassados podem nos contar? Por que não tirar um tempinho para ouvir e pesquisar esses tesouros escondidos?


Essa história, e toda a busca, para mim, foi mais um presente da minha mãe.


Feliz Dia da Imigração Japonesa! Feliz dia de louvar nossos antepassados!

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